Cimitarra Cada Vez Maior


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Ao inaugurar nova fábrica, no Rio Grande do Sul, e começar a produção de uma lancha de 76 pés de comprimento, a Cimitarra deixa claro que se tornou de vez uma grande marca e que mudou de patamar no mercado

Até pouco tempo atrás, a marca Cimitarra era quase sinônimo de barco barato, mas sem muito esmero. Os clientes gostavam, mas tinham certas ressalvas ao acabamento e falta de sofisticação dos modelos. Isso mudou radicalmente nos últimos cinco anos. Empurrada pela chegada dos grandes barcos importados ao país, que impuseram um novo padrão de exigência ao mercado, a Cimitarra não só enriqueceu o interior das suas lanchas como as fez crescer de tamanho. Como consequência, cresceu também a marca. E cresceu tanto que precisou até mudar de fábrica, porque a anterior não comportaria o mais novo barco da casa: um quase iate, de 76 pés de comprimento.

Bem mais do que apenas mais um lançamento, já que lançar barcos com muita frequência sempre fez parte do DNA deste estaleiro, a nova 760 marca, de vez, a mudança de status da Cimitarra, uma marca que existe desde 1973, mas que, ao passar para as mãos do gaúcho Tomas Ko Freitag, 16 anos atrás, só fez crescer. De tamanho e relevância no mercado, como ele conta na entrevista a seguir.

A nova fábrica é sinal que a Cimitarra continua crescendo, a despeito da crise no mercado náutico?

Sim, mas com duas ressalvas. A primeira é que a nova fábrica foi uma necessidade, porque a nova lancha que estamos fazendo, de 76 pés de comprimento, que será lançada em outubro, no São Paulo Boat Show, não cabia, na altura, nos galpões que tínhamos antes. Já a segunda ressalva é que, sim, continuamos crescendo, mas obviamente não no mesmo ritmo de antes, embora estejamos com a nossa produção já vendida até setembro. De janeiro até agora, construímos 43 barcos, de um total de 90 que faremos este ano. É a mesma produção que tivemos no ano passado. Claro que não está ruim. Mas o problema é que, no passado, crescemos

demais e muito rapidamente.E isso não é bom, porque você acaba se habituando a produzir muito e perde eficiência no processo construtivo. Agora, estamos numa fase de ajustar os processos e diminuir custos. Quanto à queda na venda de barcos, ainda não sentimos. A Cimitarra vai bem, obrigado. Mas estamos preparados, caso isso aconteça.

O que vocês pretendem fazer?

O que sempre fizemos: lançar mais e mais novos barcos. Novidade sempre vende. A cada Boat Show, lançamos, pelo menos, um barco novo. Às vezes, mais de um. Agora, no São Paulo Boat Show, vamos lançar a 76 pés, que vai ser um estouro. Nisso, seguimos a mesma filosofia da Hyundai, que vive lançando carros novos. Nos salões náuticos, somos um dos estaleiros mais visitados, justamente porque sempre temos novidades. Nossos clientes nos visitam em busca disso. Querem isso. E ali mesmo decidem trocar de barco. É uma ótima estratégia. Já a outra, que estamos praticando, há três ou quatro anos, é a melhora na qualidade e acabamento dos nossos barcos. Não que antes eles fossem ruins. Mas, com a vinda dos importados, mudaram as referências do mercado. Hoje, o comprador é bem mais exigente. E os nossos barcos não são os mesmos de antes.

Por produzir barcos mais baratos e acessíveis, a Cimitarra sempre foi muito criticada pela concorrência. Isso persiste?

Diminuiu muito, porque quem mais criticava os nossos barcos eram os representantes dos outros estaleiros, que, obviamente, só queriam vender os deles. Saíam por aí dizendo para os clientes que as nossas lanchas eram isso e aquilo e até criaram aquela série de apelidos pejorativos: “Cimitrinca”, “Cimitorra”, “Cimiracha” e por aí afora. Eles sequer deixavam os interessados experimentarem os nossos barcos, porque sabiam que, se eles fizessem isso, mudariam de ideia. Quem navega com uma Cimitarra, sente a diferença na hora. Mas isso começou a mudar quando passamos a investir em qualidade e acabamento interno e quando criamos uma rede de representantes — alguns deles, os mesmos que, até então, viviam falando mal da gente. Hoje, nossas lanchas disputam o mercado de igual para igual com as concorrentes. Mas com a diferença de que continuam custando menos.

Como isso é possível?

Entre outras coisas, limitando a nossa margem de lucro. Os estaleiros costumam trabalhar com margens acima dos 10%. Alguns, bem além disso. Mas nós não passamos de 5%. Ganhamos menos até do que os representantes que vendem os nossos barcos. Além disso, oferecemos o que chamamos de “compra inteligente”. Nela, damos ao cliente a opção de pagar menos por determinados equipamentos, já que são eles que costumam encarecer sobremaneira os barcos — ao contrário do que a maioria das pessoas pensa , a fibra de vidro, que dá forma e tamanho aos cascos, é o item mais barato em qualquer barco. O cliente pode escolher se quer pagar R$ 1 mil ou R$ 10 mil por um equipamento de tipo e marca diferentes, mas que faz, basicamente, a mesma coisa. Em quase todos os outros estaleiros, ele não tem essa opção. Na Cimitarra, sim. Mas já fomos muito criticados por isso também.

Como quando vocês ofereciam aparelhos de ar-refrigerado doméstico para as primeiras lanchas da marca?

Sim. E este é um bom exemplo. Começamos a oferecer isso na primeira lancha que fizemos, a Cimitarra 27, que tinha uma cabine espetacular para o seu porte. Era um minibarco grande. Tinha sala com 1,80 m de altura, cozinha, banheiro, dois camarotes e… ar-refrigerado — coisa que não existia para barcos desse tamanho. Mas o cliente podia escolher se queria um aparelho convencional, igual ao que tinha em casa, ou como o dos outros barcos. A diferença é que o primeiro custava dez vezes menos, sem falar que podia trabalhar com um geradorzinho portátil, que custava menos ainda. Resultado? As vendas estouraram. A Cimitarra 27 vendeu mais de 400 unidades e, até hoje, é tão procurada no mercado de usados que ninguém acha uma para comprar. Um modelo de 2005 vale hoje mais do que um zero naquela época. Foi — e ainda é — um fenômeno. Foi, também, o alavancador do crescimento da nossa marca. Por causa disso, começaram a falar mal da gente. Diziam: “onde já se viu colocar um ar-refrigerado de casa num barco?” Mas, qual é o problema, se funciona perfeitamente? Por acaso, nas casas de praia, que também estão sujeitas a maresia e umidade, todos os aparelhos de ar-refrigerado são centrais ou especiais a ponto de custarem dez vezes mais? Por isso, não descarto a possibilidade de voltar a oferecer este tipo de recurso. Se a crise apertar, uma saída é oferecer alguns modelos de barcos, também, na versão básica, ou seja, com toda a instalação feita, mas nenhum acessório a bordo. Como fazem os fabricantes de automóveis. Se quiser, a pessoa depois coloca. Eles custarão 20% menos. É a tal “compra inteligente”. A Cimitarra herdou parte da má fama do fabricante anterior da marca, que existiu até 1999. Por que, quando a comprou, você manteve o nome Cimitarra, já que passou a fazer barcos que não eram os mesmos de antes? Porque acho fantástico o trabalho de recuperação de uma marca. A história é repleta de casos bem-sucedidos desse tipo. Como Harley Davidson, Zara, Tramontina e as lojas Renner. Quando peguei a Cimitarra, ela não produzia mais do que três ou quatro unidades por ano. Hoje, faço quase 100 e já fiz bem mais do que isso. Em 16 anos, produzimos 1 470 lanchas. Ainda este ano, chegaremos a 1 500. Quanto vale uma empresa com este histórico? Mas, de certa forma, isso só foi possível porque o nome Cimitarra, bem ou mal, já era conhecido. Eu não precisei começar uma marca do zero, embora, talvez, tivesse dado menos trabalho e gerado menos críticas.

Além do custo-benefício, na sua opinião, quais são as outras características que diferenciam as lanchas Cimitarra?

Uma delas é o tamanho. Nossas lanchas são sempre bem maiores do que os números que designam os modelos. Nossa 34 pés tem, por exemplo, 38 pés de comprimento e isso acontece em toda a linha, porque medimos nossos barcos pela linha d’água, não pelo real comprimento dos cascos. Como eu já disse, a fibra de vidro é o item que menos custa no processo de fabricação de um barco. Portanto, não há razão em economizá-la. Mas não cobramos a mais por isso. Ao contrário, nosso preço é sempre mais baixo, o que é outra característica da marca. De tempos para cá, passamos a ditar os preços dos barcos dos estaleiros concorrentes, porque eles tiveram que tentar se aproximar dos nossos. Já, no tamanho, simplesmente não há como comparar nossas lanchas com as outras. As mulheres, em especial, adoram as cabines dos nossos barcos, porque elas são altas e nada apertadas. Na nova 76 pés, a altura da sala chegará a 2,80 m. Não existe nada igual. Mesmo assim, recentemente, cresci alguns modelos em um metro de comprimento.

mercado nautico

Para ficarem ainda maiores?

Nem tanto, mas sim por uma questão técnica. A maioria dos clientes estava optando por motores e geradores mais potentes, o que aumentava sobremaneira o peso na popa dos barcos. Então, para que eles mantivessem a principal característica da marca, que não é o custo-benefício, nem

o preço ou o tamanho dos cascos, mas sim a ótima navegação, resolvemos aumentar a flutuabilidade, ‘esticando’ um pouco mais os cascos. Ficou perfeito. E os clientes ainda ganharam mais espaço.

Mas uma das características das Cimitarras não era justamente usar motores de baixa potência?

Sim. E continua sendo. Nossos barcos sempre foram leves e ficaram ainda menos pesados depois que passamos a usar o método de infusão, em vez da tradicional laminação da fibra de vidro, nos cascos maiores. Por isso, não exigem motores potentes, o que também resulta em economia de combustível. Nosso forte nunca foi a alta performance, o que se consegue penas aumentando a cavalagem dos motores, mas sim a navegação uniforme, não importa qual seja a velocidade. Nossas lanchas planeiam fácil, não erguem a proa nas arrancadas e têm o mesmo comportamento tanto a 10 quanto a 25 nós. Mas alguns clientes queriam navegar rápido e resolvemos atendê-los.

Lanchas Cimitarra de 36 a 76 pés:

  • CIMITARRA 360 – É o antigo modelo de 34 pés, agora aumentado no casco. Custa a partir de R$ 480 mil.
  • CIMITARRA 400 – É o modelo de 38 pés que também cresceu e ganhou nova divisão na cabine.
  • CIMITARRA 440 – Tal qual os modelos menores, tem versões com targa, hard top, capota, fly ou minifly.
  • CIMITARRA 520 – O modelo de 50 pés também cresceu. Tem versões com fly, minifly e HT.
  • CIMITARRA 560 – Lançado no Rio Boat Show, é o maior barco da marca. Mas só até o próximo salão.
  • CIMITARRA 760 – A maior lancha da história da Cimitarra será lançada em outubro, em São Paulo.

É mais fácil vender um barco para quem nunca teve ou convencer um cliente a mudar para um modelo maior?

No nosso caso, fazer o cliente crescer o tamanho do barco, porque já temos uma boa clientela e ela é bem fiel à marca. Tem muita gente que já está na sua quarta ou quinta Cimitarra e não quer saber de outro barco. Ajuda muito nisso o fato de termos uma linha de modelos em escadinha, que vai subindo dos 36 até 76 pés. E, nos modelos menores, a diferença de preço entre eles é pequena, o que favorece a escalada. Por cerca de R$ 200 mil a mais, a pessoa passa de uma 36 pés para uma 40 pés e por aí vai. Para ajudar nesta caminhada, nós ainda garantimos aos clientes que a depreciação do barco deles será de apenas 10% no primeiro ano e 20% no segundo, quando o normal é o mercado depreciar uma lancha nova em quase 25% logo após o primeiro ano de uso. Ou seja, ele sabe que, se quiser trocar por outra Cimitarra, não perderá dinheiro. Já, no caso de um interessado em comprar o seu primeiro barco, sempre começo perguntando com qual frequência ele pretende usar a lancha. Se ele disser “pouco”, recomendo logo que o motor seja a diesel, porque barco com motor a gasolina parado muito tempo é aborrecimento na certa. Com motor diesel fica mais caro, mas ele não se arrepende. E vira cliente para sempre. Mas, de cada dez barcos que vendemos, sete são para já clientes.

Então, como explicar as filas nos salões náuticos para visitar os seus barcos?

Porque também não adotamos a política antipática de selecionar, pela cara, as pessoas que poderão visitar os nossos barcos. Isso tem a ver com o meu passado. Antes de virar fabricante, eu tinha barco e visitava os salões náuticos, para ver as novidades. Só que, como não tinha cara de milionário, como não tenho até hoje, até porque não sou um deles, era barrado. Hoje faço justamente o contrário: convido os menos privilegiados, porque sei que eles ficarão tão impressionados que sairão falando maravilhas para todo mundo. E quem sabe se alguém que os escuta não se interessa e compra? É assim que uma marca “entra” na cabeça das pessoas. Pela emoção. Estas pessoas viram nossos garotos-propaganda. E se, um dia, tiverem dinheiro suficiente, lembrarão do nome Cimitarra. Desde garoto eu sonho em ter um Mercedes Benz conversível, por causa de um carro desses que vi na infância. Um dia, eu consigo.

Mas fabricantes de “iates”, como a maioria das pessoas chamam as lanchas maiores, não são todos milionários?

Alguns, talvez, sim. Eu não, com certeza (rindo). Até porque invisto tudo o que ganho na própria fábrica. Meus barquinhos particulares são uma velha Magnum americana, com mais de 30 anos de uso, e uma lanchinha Leopard dos anos 70. Só agora estou fazendo uma Cimitarra para mim. As outras que fiz para usar, acabei vendendo para algum cliente que não queria esperar. Trabalho duro, mas não tenho do que reclamar. Meu prazer é ver a Cimitarra se tornar cada vez mais conhecida.

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