CHARUTOS E VINHOS


Nesta edição do Caruso Journal falaremos sobre a harmonização de Espumantes e Charutos

Na matéria passada, abordamos o polêmico assunto em torno da harmonização dos vinhos tintos com os charutos, assim como a dificuldade que se revela. Naquela oportunidade, abrimos um espumante para celebrar e tivemos a grata surpresa ao acompanhar o último terço de um Partagas D4. Então surgiu a ideia de falar sobre uma outra harmonização pouco usual e comum.

Como convidado especial para esta edição, resolvemos chamar um reforço de peso para proferir o voto de minerva: para o critério de escolha desta edição, César Adames comenta que o estilo do charuto proposto deve ser corpo médio para leve. André Caruso e João Granado, sócios do Caruso Lounge, nos ofertaram o lançamento da Hoyo de Monterrey, o Le Hoyo de Río Seco, lançado no Festival del Habano 2018.

Sobre A Hoyo de Monterrey

O nome Hoyo de Monterrey foi atribuído a essa marca de charutos por José Gener no ano de 1865. A plantação está localizada na área de San Juan y Martínez, na região de Vuelta Abajo, uma das melhores províncias de Cuba para plantar tabaco. O sabor suave agrada os apreciadores que preferem um charuto de fortaleza leve, delicado e aromático, com elegância e complexidade de sabores. Interessante para quem está iniciando na arte de degustar charutos.

A degustação do Rio Seco

O Le Hoyo de Río Seco é o mais novo charuto adicionado ao portfólio. Trata-se de uma bitola com ring de 56 por 140mm de comprimento, nome de galera Armorosos. Embora seja sutilmente mais encorpado do que os charutos clássicos da marca, apresenta leves aromas herbáceos, terrosos e de tabaco.No paladar, é um charuto leve, complexo e elegante, mas ainda muito novo (Setembro de 2018). Sugerimos ao menos 06 meses de guarda, para equilibrar melhor os sabores e aromas.

Por quê os Espumantes?

Acreditamos que os espumantes têm o perfil de um vinho muito versátil, que conseguem fazer não só o papel de celebrações, como também conseguem atender a uma gama grande de harmonizações com inúmeros pratos. Também acreditamos que, devido ao seu caráter de frescor e intensidade de sabor, podem ajudar todo charuteiro a encontrar uma nova opção para refrescar e limpar o paladar.

Antes de começar a degustação, vamos falar um pouco sobre o que são espumantes.

O que são Espumantes?

“Champagne é um vinho que deu errado” famosa frase que já circulou em diversas rodas de conversas e que em algum momento você, caro leitor, já deve ter ouvido. A afirmação acima não é totalmente correta, uma vez que o surgimento dela foi provavelmente mais por acidente e posteriormente por erros e acertos até 1860, quando Louis Pasteur fez a descoberta sobre as leveduras e a fermentação.

Nos séculos XVI e XVII, a região de Champagne, uma das regiões frias de produção, era conhecida por fazer vinhos ordinários, de elevada acidez e de pouco corpo, devido ao clima desfavorável à produção de vinhos tranquilos (embora nos dias atuais sejam produzidos em quantidades muito limitadas). Pela ausência de conhecimento sobre como a fermentação ocorria, o vinho engarrafado não era armazenado em temperaturas corretas e, com isso, começava a refermentar, logo seu nível de CO2 (Gás Carbônico) subia exponencialmente.

A fermentação começava a atuar principalmente no verão por conta do aumento de temperatura e da pressão interna, levando ao rompimento da garrafa, resultando na perda do vinho. A única forma encontrada para isolar a bebida e suas leveduras, foi obter garrafas de vidro de camadas mais grossas e colocá-las de ponta-cabeça.

Em 1816, Antoine de Muller, chef de cave de Nicole Ponsardin Clicquot, propôs fechar garrafas com tampinhas, feitas de ferro em formato “coroa”, colocá-las na horizontal, em orifícios feitos em uma mesa, e girar diariamente até que os sedimentos (leveduras), chegassem ao topo da garrafa, que depois era congelada. Desta forma, os sedimentos são jogados fora sem que haja uma grande perda de líquido. O resultado obtido foi uma bebida melhor elaborada, consistente e de boa qualidade, que até então se obtinha por tentativa e erro. Assim iníciou-se a elaboração de uma das bebidas mais consumidas nas celebrações pelo mundo.

Todo Champagne é espumante, mas nem todo espumante é um Champagne

Espumante é o termo usado para designar um vinho que passou por uma segunda fermentação de forma isolada, seja ela em garrafa ou em cubas de aço inox. Essa segunda fermentação tem como objetivo obter a desejada borbulha de forma natural, sem a gaseificação artificial.

Champagne é uma região com apelação de origem situada na região nordeste da França. A região possui uma zona de produção delimitada, com rígidas regras de produção. A apelação também impede que outras regiões no mundo possam produzir espumantes sob a alcunha de “Champagnes”. A exceção fica para a Peterlongo, produtor da Serra Gaúcha que produz espumantes anteriormente à 1927, ano de oficialização da apelação Champagne e que por conta disso, obteve o direito de identificar seus vinhos como “Champagne” e não simplesmente “Espumantes”.

Existem outras apelações ou denominações de origem bastante conhecidas como Prosecco DOC ou Cava D.O., mas sem o mesmo prestígio de Champagne. Outros exemplos de apelações de espumantes são: Franciacorta DOCG, que produz excelentes vinhos pelo método clássico (ou “Champenoise”) e a recém promovida D.O. Pinto Bandeira, na Serra Gaúcha aqui do Brasil.

Brut, Extra-Brut, Brut Nature… o que são?

Como acima explicado, o espumante é um vinho que passa pelo processo de segunda fermentação, a qual requer uma quantidade mínima de açúcar proveniente da primeira fermentação, porém, por questão de estilo, muitos produtores preferem adicionar uma espécie de licor, que contém mistura de leveduras e açúcares, conhecida como licor de tirage agindo sobre o vinho existente, dando-lhe aromas e sabores extras.
Posteriormente, o vinho passa por um processo chamado Remuage, cujo objetivo é retirar as leveduras mortas do líquido, elevando-as até o topo da garrafa. Depois, resfria-se o topo da garrafa, retirando as leveduras e repondo o líquido perdido com a adição de outra dose de licor a base de açúcar e vinho reserva, conhecido como licor de expedição. É nesse licor que a quantidade de açúcar é definida, determinando o quão seco será o espumante. Para isso existem regras que mudam de acordo com a legislação de sua apelação de origem.

O Brut varia entre 0,2 a 12 gramas de açúcar por litro, dentro de uma garrafa de 750ml. Por ser o termo mais conhecido, decidimos utilizá-lo para a elaboração desta matéria.

Os vinhos a seguir foram colocados em ordem de corpo e origem, sem ser informado os valores. Utilizando taças Flute, foram servidos a 6º Celsius. Para não atrapalhar as notas aromáticas, os vinhos foram degustados antes de acender os charutos.

Vamos à degustação.

 

1. Serena Ville d’Arfanta Gran Cuvée Brut N.V. 11% (Vêneto – Itália)

Amarelo palha com tons oxidativos. Média intensidade de aroma lembrando pêra. Em boca, pouca perlage, embora tenha frescor para compensar. Na harmonização, o Rio Seco comprometeu o segundo terço do charuto em diante.

De toda forma, por ser um vinho simples para beber sem compromisso, decidimos mantê-lo na lista, ainda que em quinto lugar.Onde adquirir: tahaavinhos.com.br
Preço médio: R$ 54,00

2. Hermann Lírica Brut N.V. 11,8% (Pinto Bandeira – Brasil)

Bom espumante produzido pela excelente Cave Geisse para a Hermann, família proprietária da importadora Decanter. Intenso aromaticamente, possui toques de manteiga e fruta em calda. Acidez média com perlage intensa na boca.

Na harmonização, o primeiro e segundo terço do charuto foram bem, prejudicando-se somente no terceiro terço, onde aumentou a sensação de amargor. Ficou em quarto lugar.
Onde adquirir: decanter.com.br
Preço médio: R$ 64,00

3. Lídio Carraro Dádivas Blanc de Blancs N.V. 12% (Encruzilhada do Sul – Brasil)

Outro bom produtor brasileiro, produzindo este Blanc des Blancs (100% Chardonnay). Intenso, fresco e concentrado no aroma, com o típico toque de leveduras, característica da segunda fermentação em garrafa. Em boca, faltou um pouco mais de firmeza na perlage, em comparação com o Hermann. Com o Hoyo, houve pontos altos, mas se perdeu em razão da perlage menos consistente. Ficou em terceiro lugar.Onde adquirir: lidiocarraro.com
Preço médio: R$ 79,00

4. Aliança Rosé Bruto 2015 (Dão – Portugal)

Rosé salmão de tons claros. Intenso, com toques de frutas vermelhas frescas in natura. Bem equilibrado em boca, de acidez média alta e perlage média. Antes de começar a degustação, Cláudio comentou que, só de sentir o aroma, este seria provavelmente a melhor harmonização da mesa. Ficou com o honroso segundo lugar.
Onde adquirir: portusimportadora.com.br
Preço médio: R$ 142,00

5. V. Cestulat Blanc des Noirs N.V. (Champagne – França)

Situada na sub-região de Epernay, esta pequena casa de Champagne trouxe uma grata surpresa à mesa: corte de 50% Pinot Noir e 50% Pinot Meunier, com equilíbrio, seu aroma de menor intensidade nos remete a um encantador aroma de pão e brioche, com traços levemente oxidativos, sabor de creme brulée e belo frescor em boca trouxe à tona a harmonização como perfeita: aromas que não desvaneceram com o poder aromático do tabaco mantendo o paladar fresco a cada gole. Ficou em primeiro lugar.
Onde adquirir: viavinum.com.br
Preço médio: R$ 288,00

Veredicto final

César foi taxativo em mesa: todos os vinhos são de excelente qualidade e cumpriram o papel proposto.

A Caves Aliança Rosé Brut e o Champagne Cestulat foram os que tiveram votos distintos entre os dois colunistas. O voto final do César foi determinante na decisão, ao ressaltar a qualidade e a delicadeza da perlage e, sobretudo, o equilíbrio na acidez que foi o critério de desempate. Assim concluímos que o Champagne Cestulat foi a melhor harmonização proposta. Concordamos de pronto e ainda ficamos mais contentes com os resultados, comprovando que o vinho espumante merece a atenção do nosso leitor para acompanhar seus charutos nas mesas do Caruso Lounge.

Terminologias

N.V.: Non-Vintage, ou seja, não safradas.

Blancs des Blanc: termo utilizado para designar espumantes100% Chardonnay.

Blancs de Noirs: termo utilizado para designar espumantes produzidos com uvas tintas, como Pinot Noir e Meunier.

Bruto: termo usado em Portugal para “Brut”.

Perlage: do francês “pérola”, em referência às borbulhas da bebida.

Champenoise (ou método clássico): refere-se a segunda fermentação em garrafa e somente pode ser utilizado para espumantes oriundos da região de Champagne.

 

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